quarta-feira, 9 de setembro de 2009

Se Arrependimento Matasse

    - Se fizer isso, vai direto para o inferno!
    As palavras enfáticas do Padre Carlson nem fizeram cócegas em suas intenções, a decisão estava tomada em sua cabeça.
    - Estou melhor que você Padre, é você quem vai ficar nesse inferno. Já eu vou para um lugar onde não há dor nem choro, nem ódio nem rancor, nem tristeza nem remorso.
    - E quem você vai ajudar?
    Silêncio.

    Em meio a prédios altíssimos e ao tumulto da cidade estava a Matriz Católica, imensa também. Não sei se a construção era enorme e suntuosa por causa da evolução das cidades ou se os prédios é que seguiram o exemplo dos templos.
    Mas, continuando, atrás da igreja havia um amplo jardim, com flores e caminhos de grama, bancos brancos para descansar e uma jabuticabeira perfeita para se...
    Bem, eles estavam ali, naquele momento angustiante.

    - Ora, pense bem nesse mundo ideal que você pinta, é um mundo mais egoísta que o real, mais egoísta... que o real. - O Padre se entristece com as próprias palavras. Mesmo ele, que estava testando seu argumento, usando qualquer artifício para que aquela garota parasse o que estava tentando. - Esse lugar é irreal! Se pensar que uma das obrigações que Cristo nos deixou é de ajudar os outros, de que adianta um lugar onde todos já tem tudo?
    - Padrinho, nossa vida é turbulenta assim exatamente para desejarmos um lugar melhor, e é para lá que quero ir: sem preocupações, sem dívidas, sem ninguém pra precisar ajudar por obrigação...

    Ela tinha 15 anos, um rosto claro e angelical apesar dos cabelos serem negros e longos. Os olhos da mesma forma escuros demonstravam total confiança no que pretendia. Sem lágrimas nem lábios trêmulos. (Eu a acolheria no céu...)

    - Acha que esse lugar que você vai ficar é melhor? - Ela pergunta firme, olhando-o dentro dos olhos.
    - Não, não acho, mas na hora do julgamento Cristo vai ter muito menos perguntas para mim do que para você.
    - Ah é? E como você vai se explicar se não tiver finalizado tudo o que devia?
    Silêncio.

    Carlson já passava da meia idade. Tinha conhecimento de sobra acerca das leis de Deus, mas o momento era muito crítico, aquela menina não desistia.
    Ele estava de folga, roupa social, sem batina, suava por todos os poros. Percebia-se que ele não estava tão certo do que fazia, apenas queria afastar a menina daquela corda presa na jabuticabeira.
    O vento cortou o silêncio mexendo nos galhos da grande árvore.

    - Quer saber Padre, desisto! - Lawiny disse isso esperançosa de que ele viesse atrás dela. - Eu vou embora pra casa, fique aí sozinho...
    Ela se afastou. Carlson a viu indo embora, de vestido fino, levantado pelo vento. Ele pediu perdão a Deus pelos pensamentos odiosos, amorosos que tivera em relação a ela, mas desistiu de lutar contra eles. Disse para si: vou esquecer as regras idiotas e vou me casar com ela.
    Ele quis correr e abraçá-la, mas o vento estava muito forte. Desequilibrou. O pequeno banco aonde ele se apoiava caiu de lado e a corda estava justa demais. O barulho da fratura cervical foi abafado pelo das folhas que revoavam.
    A menina ficou sabendo tempos depois, chorou copiosamente por perder aquele por quem nutria tão puro sentimento e afeição, mas nunca soube que foi um acidente, visto que ele havia mudado de idéia: "Eu tentei ajudá-lo, mãe, eu tentei!".
    Os anjos do inferno assistiam a tudo com um sentimento que misturava felicidade e perplexidade. E receberam o Padre de braços abertos.

2 comentários:

  1. Esse texto ficou muito bom, poderia muito bem virar um curta... seria interessante ver a historia dele em movimento

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  2. nossa....como eu falei pra você, tive que ler umas cinco vezes pra acreditar...
    essa história engana as pessoas...rsrsrsrs...
    achei muito interessante justamente por isso, aquele ditado "nem tudo é o que parece" se encaixa perfeitamente aqui!!!
    continue escrevendo ok!!!

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