sábado, 14 de novembro de 2009

O repartir dos pães e peixes

Mt 14.13-21 Mc 6.30-44 Lc 9.10-17 Jo 6.1-15

    Normalmente, se dissermos que o milagre nessa passagem na verdade foi a repartição dos pães e dos peixes, logo nos interromperão dizendo: “Você está querendo reduzir o poder de Deus”, porém, talvez, quem assume a multiplicação é que o reduz.
    A partir do momento que Jesus precisa multiplicar matéria física para produzir milagre, algum ponto está falhando. A intenção de Jesus era a Boa Nova, a mudança de vida, de mentalidade de um povo de dura cerviz.

    Para o povo judaico, quem possuía mais riquezas era abençoado e amado por Deus e, quem não tinha, não tinha por ser odiado por Deus e estar cheio de pecados. Essas pessoas ficavam à margem da sociedade, assim como os doentes, que eram vistos da mesma forma.

    Como vemos na passagem do jovem rico e em muitas outras, pessoas ricas e instruídas na lei seguiam Jesus além dos enfermos, o que significa dizer que, no momento da “multiplicação”, estavam todos esses reunidos.
    Será que nenhuma dessas pessoas de posses, ditas abençoadas por Deus, tinha nada pra comer? Se nenhum deles tinha o que comer, como um garotinho tinha cinco pães e dois peixes? E mais, em todos os evangelhos aparece a palavra partiu ou repartiu, porém não a palavra multiplicou. Essa não aparece mesmo. Nem nos evangelhos e nem nos títulos, posto que não existem nos originais.

    Antes de Jesus curar o paralítico que “desceu do teto”, em Lc 5.17, ele perdoa seus pecados. Pronto! O Cristo não precisaria fazer mais nada. Mas o povo da época achava que as doenças estavam diretamente ligadas aos pecados das pessoas. Então Jesus diz: “mas para que saibam que o Filho do Homem tem na terra poder para perdoar os pecados...”. O milagre já tinha sido feito: o perdão. A cura vem só para prová-lo!
    Da mesma forma Jesus não ensina nada simplesmente multiplicando pão. Essa não é a intenção. Sua intenção era a mudança de atitude de um povo que vinha entendendo tudo errado. Se olharmos a passagem com foco no repartir do pão, compreendemos o real intuito de Deus, que é a base do cristianismo até hoje. Olharmos o irmão que está ao nosso lado e repartir com ele o que temos. Essa é a ordem de Jesus aos discípulos: “Dêem vocês a eles o que comer!”.
    Imagina o absurdo que foi para a época ver um rico (escolhido de Deus) cortar um pedaço de pão e entregar a um doente (excluído por Deus). Esse foi o milagre, uma transformação no modo de pensar de toda uma sociedade que vivia em função disso: reter o que é bom para si, pois é dádiva de Deus e excluir os que não tem, pois Deus quis assim.

    Quando, em João, a multidão vai embora depois que Jesus questiona o porquê de o seguirem, é porque não entendem que deviam buscar o principal, que era Jesus em si e não a comida. Os ricos vão embora por duas razões: ou gostavam de se ver superiores repartindo o que tinham e, quando os pobres foram embora, ficaram sem ter como se manter por cima ou esperavam ouvir de Jesus algo diferente do que ouviram nessa passagem.
    Os ensinamentos de Jesus eram geralmente voltados aos discípulos, tanto que as parábolas eram explicadas a eles. Isso significa que não era a vontade de Jesus que a multidão ficasse com ele, senão continuaria “alimentando-a”. Mas ele pergunta aos 12: “querem ir embora também?”, e eles ficam, confirmando que seu objetivo tinha sido cumprido. Eles aprenderam e ficaram, e foram eles que "fundaram" a então Igreja de Jesus Cristo.

Concorda?

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