Conto solicitado por Cwkruger em Peça um Conto.
- Sai de baixo! - Espada gritou enquanto pulava para escapar da baforada gélida da besta. O cheiro era horrível, fétido, como carne conservada no gelo por muito tempo.
Magia não pulou, invocou uma barreira elemental, evitando que virasse picolé. Não cheguei muito perto, fiquei na passagem de pedras que dava para o imenso salão onde dormia calmamente, ou não, o dragão azul. No momento da baforada eu olhei para o outro lado, não queria ver meus companheiros morrendo, e então percebi alguém ao longe. Tinha os cabelos compridos, lisos e negros. Algo brilhava em sua mão direita que, mesmo fechada, dava para enxergar feixes vermelhos escapando por entre os dedos. Lembrei-me de uma história contada por um pescador chamado Afthalan, onde certo homem controlava outros seres por meio de duas pedras mágicas: uma em sua mão e outra na...
Exato! Entre os olhos do imenso dragão havia um rubi, e não hesitei em avisar:
- Aquele homem está controlando o bicho com a pedra que tem na mão! - Apontei com o braço esticado para que vissem e fiz uma oração silenciosa agradecendo a Deus por ter me mostrado.
***
Passamos por muita coisa para chegar até ali. Foi uma legião de goblins e hobgoblins, homens lagarto, nagahs, sem falar nos perigos próprios da subida, quase que escalada, de uma montanha congelada.
Foi a princesa pessoalmente que me solicitou esse serviço, essa busca pelo colar de seu pai, eterno rei de Eterrina. Ela me pediu e me encaminhou aos mais graduados mestres nas artes da batalha, um guerreiro e um mago, com documentos solicitando seus serviços, manuscritos redigidos e assinados pelas suas belas e delicadas mãos, senão as mais perfeitas mãos de todos os reinos...
A princesa era linda, demasiada linda, ao ponto de estar além do poder de descrição das palavras. Uma beleza que não existia para ser entendida, nem tampouco descrita, mas para ser admirada, contemplada. Era linda e todo o amor do mundo que a ela fosse oferecido seria pouco.
Enquanto eu caminhava para convocar os companheiros que, posteriormente, iriam confrontar-se com a mais temida das bestas, olhava cada letra do que fora escrito por ELA, Riqueza. Letras de fada! Nunca li nada escrito por uma fada, mas se for belo como dizem, sim, será como as letras de minha amada. Minha princesa, que talvez nunca seja minha... Minha jornada ao ataque praticamente suicida é por você minha bela, só por você.
***
Quando o homem percebeu que Espada corria em sua direção, levantou a mão esquerda e lançou um raio negro em sua direção. O golpe pegou no imenso machado que carregava, o machado bateu em sua armadura gigante de prata e o guerreiro foi arremessado uns dez metros. O que deu para entender foi que ele havia incitado o dragão a atacar o mago e, enquanto lançava o feitiço em Espada, não percebeu que Magia contornou por trás e deslizou rapidamente no chão escorregadio, deixando que o sopro do dragão o perseguisse. O homem estava no meio do caminho e não teve tempo de desviar, foi congelado no ato. Magia continuou deslizando e só conseguiu parar por conta da ajuda da parede à frente.
No instante em que o homem congelou, o dragão ficou inerte. Espada levantou e, em um salto, decepou a mão que segurava aquela pedra. A outra pedra, na testa do monstro, caiu lá de cima. Ele meneou a cabeça e olhou para frente. - Deus do céu! É agora que parto dessa para uma melhor. - Ele olhou dentro dos meus olhos - minha alma fugiu desesperada - mas não fez nada além disso. Observou a abertura nas pedras, uns 20 metros acima, bateu as asas duas vezes e saiu.
Magia batia com as mãos em seu manto vermelho para retirar a sujeira acumulada com a queda enquanto eu corria em direção à estátua congelada no meio daquela toca. Ele estava com o colar. Retirei-o e guardei na algibeira. Magia abriu os dedos congelados com dificuldade e retirou o rubi da mão. Espada lhe entregou o outro, que estava a um passo de distância.
Voltamos.
 ***
Após chegarmos e nos aprontarmos devidamente fomos ter com a princesa. Aguardamos até que fui chamado.
- Minha soberana. Eis que lhe trago o prometido. Não cumpri porque era ordem, mas sim porque era para vossa alteza.
Abri a mão em sua frente, com a cabeça abaixada, deixando o colar à mostra.
Ela colocou a mão em meu queixo e levantou-me a face. Olhou em meus olhos com os olhos mais verdes e perfeitos do reinado e disse: onde estão seus amigos?
Suas palavras não vieram suaves como no dia em que me chamou para a missão. Não respondi, apenas apontei com o dedo para trás.
- Tragam-nos aqui! - Disse, levantando-se.
Fiquei ainda ajoelhado, não acreditando no que a minha deusa estava fazendo. Ela mandou revistá-los, e não puderam fazer nada enquanto os guardas rasgavam suas roupas.
- É isso! - Disse ela. - Me dê!
Olhei de relance, eram os rubis.
- Era disso que eu estava falando. Você acha que eu estava atrás de um colarzinho medíocre que meu pai perdeu por ser um tolo? Agora meu reinado será completo, pois controlarei até os deuses!
Não consegui evitar as lágrimas de escorrerem e pingarem no chão. Meu amor à princesa havia trazido a destruição e condenação para todo o povo.
Um grande barulho interrompeu meus pensamentos, todos corremos para a sacada da corte, menos a princesa que ainda admirava seu mais novo artefato de destruição em massa... Na verdade destruição em massa era o que estava vindo.
- Veja Sacerdote! O dragão está vindo para cá. - Espada me avisou do que eu já via de longe.
Além do dragão, vinham com ele centenas, senão milhares de mortos-vivos. Certamente um acordo com a deusa das profundezas para evitar o controle de Riqueza sobre o mundo. Virei e observei o amor de minha vida. Mesmo com raiva eu continuava a amando. Olhei para o dragão de olhos furiosos vindo ao longe, levantei as mãos e invoquei os poderes dos céus:
- Em nome de Deus, besta azul das montanhas entorpecentes, eu te ordeno que pare!
Ouve silêncio no castelo, todos olharam para mim. Nessa hora, Espada, meu companheiro e amigo de muitos anos, o mais forte que conheci, chorou.
O dragão não parou e eu pude ainda observar grande parte da população ser dizimada diante de minhas palmas erguidas. O alvo de meu amor havia mudado. Eu amei mais a princesa... do que Deus.
Lembrei de quando Deus me mostrou o que devia ser feito no covil do dragão e como nos sustentou até ali. Bravamente Espada, Magia e eu lutamos juntos, e Deus estava conosco em todas as batalhas... até que um de nós se desviou.
E entendi que a espada e a magia de nada servem sem o sacerdote.
Adorei o conto. E entendi a indireta. Huhauhauhuauahuhauhauhauhauhuahuahuahuahuahuahuhauhauhauhauhuahuahuahuahuahuhauhauhauhauhauhuahua
ResponderExcluirObrigado, que bom que gostou.
ResponderExcluirInclusive a parte em negrito no meio do texto é um link que faz referência ao seu prórpio blog.
Foi uma maneira que encontrei de dedicar-te o texto, utilizando de suas próprias palavras.
Mas a indireta, se é que houve, não foi intencional, mas a mensagem sim! Coloquei as palavras Espada e Magia para me localizar e substituir por nomes reais depois, a princesa também não tinha nome. Como essas palavras fecharam muito bem com o simbolismo que criei, acabei por colocar Riqueza...
Reparei que você colocou aquele parágrafo de minha autoria. Fiquei com a impressão de que você quis dizer que eu amo mais minha amada do que a Deus. (O que talvez fosse verdadeiro... Ou não? Conversarei com Deus sobre isso essa noite...)
ResponderExcluirMas agradeço, e gostei bastante. Agora entre em meu blog http://contosderpg.blogspot.com